terça-feira, 12 de maio de 2009

O LIVRO ( sem nome ) - SEGUNDA PARTE

O LIVRO ( sem nome )

SEGUNDA PARTE



Um novo dia vai despertando no Reino Encantado.
O Sol desponta no horizonte e os pássaros fazem algazarra saudando o novo dia.
Sinto-me saindo de mansinho das lembranças de um viver de tempos findos para novas lembranças de tempos idos.
São as lembranças de duas vidas entrelaçadas cheias de sonhos desconhecidos que me deixaram sentir o coração preso, sem liberdade, sem poder voltar ao passado, demasiado tarde para retroceder.
Tempo!
Somente este poderá dizer porque continuo a chamar teu nome suavemente quando a noite chega.
Lúcia se aproxima e com seu jeito alegre começa a questionar:
- Então minha mimosa, preparada?
- Preparada mesmo, não estou não. Fica difícil lembrar do depois dos meus quinze anos. Tantos erros que cometi...
- Então não fale querida. Não quero que sofra.
- Eu preciso falar, eu preciso colocar para fora tudo o que até então ficou guardado no meu coração e mente. E te agradeço por me ouvir.
- É isso o que está fazendo não é Wal? Seguindo a orientação do teu Mestre que diz: Somente quando trazemos à tona e enfrentamos nossos erros e nos perdoamos, é que podemos continuar nossa caminhada. Com estas tuas lembranças, a curadora está se curando.
- Quero te lembrar menina que eu contei para você que estudava em colégio católico e que também aos dez anos conheci o pai de meus filhos.
- Sim, eu lembro. Você disse também que ele era teu único amigo na vida real.
- É verdade. Ele foi o único amigo que tive até os meus trinta e um anos. Amigo mesmo. Confidente e companheiro.
- Porque então vocês se separaram?
- Bem, isto é uma outra história. Os porquês são muitos. Mais dois amigos se uniram para trair uma amizade. Basicamente é isso. Um dia quem sabe te conto.
- Dois? Mas você não disse que ele era teu único amigo?
- Sim, e reafirmo. Amigo homem. Mas você tem que considerar que eu pudesse ter uma amiga mulher também, não é verdade?
- Esqueci o detalhe – disse Lúcia rindo. Me diga uma coisa mimosa, o teu amigo Maia sabia do teu amigo Mário?
- Enquanto eu podia estar com Mário não. Depois que ele me abandonou sim. Contei para Maia sobre a existência dele, sobre minha busca e sobre o meu ato impensado também.
- E ele acreditou? Ele também acreditava que é possível ver e ouvir seres que não estão neste plano.
- Acreditou apenas na proporção que ele acreditava em mim, mas teve a prova também. Ai passou a acreditar e respeitar.
- Prova? Qual prova?
- Espera menina. Deixa eu contar na seqüência, caso contrário você não vai entender nada.
- Certo querida, sou toda ouvidos.
- Na manhã seguinte à minha frustrada tentativa, ao chegar no colégio, eu não estava para brincadeira e muito menos para estudar alguma coisa. Aproveitando um intervalo de aula, sai e fui me refugiar embaixo do pé de jabuticaba. Deu a hora do recreio e Maia veio ao meu encontro. Foi logo questionando, querendo saber o que se passava, e aliviada por tê-lo como ouvinte, despejei tudo. Falei tudo. Falei de Mário, falei da minha dor, falei tudo. Acho que foi somente ai que Maia passou a me ver como uma jovem mulher, pois até então éramos apenas “duas encrencas inseparáveis”.
- Duas encrencas...Essa é muito boa, mimosa!
- Verdade menina. Tinhamos uma madre superiora, Irmã Iluminata, que dizia: Deus não há de permitir que vocês dois venham a se apaixonar e casar. Os filhos de vocês serão incontroláveis. Ela falou tantas vezes isso, que acabou acontecendo: Deus permitiu! O Deus que há em mim olhou para o Deus que havia nele e disseram : Namastê.
- Mas você é uma sacripanta mesmo. Depois diz que sou eu quem brinca com coisa séria.
- Ah criança, não seria este viver uma grande brincadeira? Pensa nisso!
- Continuando, nós dois, pela primeira vez ao sairmos do colégio, seguimos juntos para casa conversando. Maia queria saber tudo e eu queria contar tudo. Ao final de longa conversa, onde coloquei todo meu sentir e ele o dele também, fizemos um pacto de sangue.
- O que você está falando? Pacto de sangue?
- É. O inicio de um assimilar de modismo. Eu não aceitava nada que me era imposto como regra sem questionar. Tinha que ser muito bem explicado para eu após digerir dizer: está bem, aceito como verdade. Infelizmente, após este tal pacto de sangue mudei, e passei a ver o mundo de forma conceitual, aceitando os pré-conceitos como verdadeiros. Alguns deles, é bem verdade, mas aceitei.
- Então era moda fazer pacto de sangue? E como era isso?
- Fazer um pequeno corte em um e no outro também. No depois, misturávamos o sangue, encostando um corte no outro e jurávamos amizade eterna.
- Nossa! Naquela época podia. Hoje seria um espalhar de AIDS sem fim.
- Viu como você também sabe brincar com coisas sérias? Mas deixa eu continuar. Até meus quinze anos eu não havia namorado. Na verdade, eu queria mesmo era entrar para o convento, o que meu pai não permitiu.
- Você queria ser freira? Eu também, respondeu Lúcia. Já pensou? Nós duas deixaríamos o Padre Cebola maluco!
- Meu pai tinha toda a razão em não permitir. Eu não tinha nenhuma tendência ao celibato. Mesmo porque eu já amava o Mário com todo o meu coração e alma.
- Então você resolveu se casar. Foi isso?
- Sim, foi isso. Querer me casar para dar uma satisfação à sociedade. Ter família, filhos, era o certo. O motivo, os meios é que foram errados.
- De que erros fala?
- De vários, mas todos eles calcados no maior de todos: Dar mais importância ao Ter do que ao Ser.

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